terça-feira, abril 06, 2004

Tratando bem quem merece – a luta por melhores condições de trabalho, nos serviços de atenção psicosocial.

Embora caminhemos juntos nos serviços de atenção psicosocial, nós loucos somos essencialmente diferentes uns dos outros. E essas diferenças são feitas à partir das várias origens e experiências a que cada um foi submetido. A loucura é democrática. Atinge jovens e velhos, ricos e pobres, camponeses e urbanos, canalhas e honrados.
Por tudo isso, erro crasso querer simplificar nossas necessidades. Ou querer afastar-nos da gestão de nossas possíveis relações terapêuticas, na saúde mental. Ao contrário, quanto mais estivermos envolvidos nesse processo, menor a recorrência dos sintomas.
É claro que isso vai contra qualquer tipo de tratamento massificado, destes propostos pelas indústrias: farmacêutica, da loucura (via psiquiatras manicomiais e donos de hospícios) e governos neoliberais, que desejam implantar o lucro como medida de qualidade, no atendimento da população.
Humanizar o tratamento da loucura pressupõe profissionais com os equipamentos técnicos apropriados e em constante aperfeiçoamento profissional e pessoal. Até porque nestes casos, uma está diretamente relacionada à outra. É muito difícil atender bem a uma pessoa transtornada, se o trabalhador estiver mal humorado ou estressado demais. Nós loucos costumamos ter uma grande sensibilidade a determinadas posturas. É vital investir em recursos humanos, no segmento da saúde mental. Basta observar que daí vem as maiores e melhores possibilidades de tratamento.
A ciência não possui grandes máquinas capazes de examinar a alma, a mente das pessoas. Dispomos basicamente de cuidadores, que precisam estar em paz com suas estruturas funcionais básicas: sociais, pessoais e mentais. Como possibilitar isso? Através de constantes e regulares supervisões, um ambiente de trabalho com infraestrutura para boas oficinas terapêuticas, um salário que propicie dignidade e segurança e, não podemos esquecer, a redução do tempo gasto com trabalhos burocráticos, que hoje atravancam o exercício da verdadeira função destes profissionais, a atenção psicosocial.
Essa preocupação, no entanto, deve estar presente nas lutas por um SUS melhor, por parte dos usuários. Essa foi a grande reivindicação que observamos, durante a X Plenária Nacional dos Conselheiros de Saúde, ocasião em que debatemos a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUS. Na verdade o argumento é simples, mas eficiente: como queremos que os trabalhadores de saúde tratem bem os usuários, se eles mesmos estão enfrentando grandes dificuldades nos cotidianos dos serviços? Essa, portanto, tem que ser uma bandeira de luta para todos.


Nilo Marques de Medeiros Neto
Conselheiro Municipal de Saúde – Florianópolis/SC
23 de Dezembro de 2002

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